O aumento significativo das Ações por Erro Médico: Perspectivas Ampliadas e Análises Críticas

O aumento significativo no volume de processos por “erro médico” no Brasil, especialmente no contexto pós-pandemia, revela as multifacetadas dimensões desse fenômeno jurídico e médico. Conforme um estudo recente com dados do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), esse crescimento não apenas reflete as complexidades das relações médico-paciente mas também marca uma evolução na advocacia especializada em saúde.

“O Brasil registrou, em 2023, cerca de 25 mil processos por “erro médico” - ou danos materiais ou morais decorrentes da prestação de serviços de saúde, denominação que passou a ser adotada neste ano pelo Judiciário. O volume representa alta de 35% em relação a 2020, segundo dados do Conselho Nacional de Justiça (CNJ).

Nos últimos quatro anos foram 91 mil ações. Os pedidos de indenização são altos e tendem a se concentrar no setor privado, onde as condenações são maiores e estão 70% dos processos.

O Judiciário deixou de adotar o termo “erro médico” porque entidades que representam a categoria alegaram que, com base na Tabela Processual Unificada, que traz as classificações processuais, envolveria também processos apresentados contra hospitais (públicos e privados) e profissionais de outras categorias da saúde.”

A análise desses processos, contudo, ganha profundidade com a contribuição do Dr. Tertius Rebelo, advogado especialista em Direito Médico, cujas observações enriquecem nossa compreensão sobre a matéria.

Dr. Rebelo aponta, com preocupação, a ausência de dados precisos por parte do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) em 2023, um fator que complica a análise completa do cenário. No entanto, suas experiências e estudos indicam áreas específicas da medicina com altas taxas de litigância. A obstetrícia, ortopedia e cirurgia plástica são destacadas como uma das especialidades mais processadas, uma realidade atribuída tanto a erros médicos quanto a falhas na comunicação com os pacientes. Essas intercorrências e maus resultados, segundo o especialista, muitas vezes derivam de uma complexa mistura de falhas técnicas e de diálogo.

A situação nos hospitais do Sistema Único de Saúde (SUS) também é motivo de alarme. Dr. Rebelo destaca a precariedade no atendimento, decorrente da falta de profissionais e insumos, levando a um aumento no desgaste e estresse dos profissionais da saúde. Esse cenário, por sua vez, contribui para a incidência de falhas médicas, refletindo-se no volume de ações judiciais.

Na ortopedia, as cirurgias de alta complexidade, como a colocação de prótese de quadril e operações de hérnia de disco extrusa, representam um alto risco de complicações e danos permanentes de locomoção, o que explica o número considerável de processos nesta área.

Outro ponto crítico destacado pelo Dr. Rebelo diz respeito à comunicação entre médicos e pacientes. Muitos casos chegam ao judiciário e aos Conselhos Regionais de Medicina (CRMs) devido à comunicação falha e à não obtenção adequada e por escrito do consentimento esclarecido dos pacientes. Esta falha procedimental, muitas vezes, transforma desentendimentos e insatisfações em litígios.

Além disso, a cirurgia plástica surge como uma área de crescente preocupação. O Brasil, ocupando a segunda posição mundial em número de cirurgias plásticas, enfrenta um alto percentual de possibilidade de intercorrências e resultados insatisfatórios, segundo o especialista. Este dado não apenas reflete a popularidade do procedimento mas também sublinha a importância da gestão de expectativas e da comunicação clara sobre os riscos envolvidos.

A contribuição do Dr. Tertius Rebelo para a discussão sobre o aumento das ações por erro médico no Brasil amplia nossa visão sobre as causas subjacentes e os desafios enfrentados tanto pela comunidade médica quanto pelos pacientes. Sua análise enfatiza a necessidade de melhorias na comunicação, na infraestrutura do sistema de saúde e na educação dos pacientes sobre os procedimentos médicos.

Este cenário complexo e desafiador, portanto, não apenas exige uma advocacia especializada e sensível às nuances do direito médico mas também uma reflexão profunda sobre como melhorar a relação médico-paciente e, por consequência, reduzir a litigiosidade na área da saúde.

Fonte: Teixeira, Fernando. "Volume de processos por ‘erro médico’ cresce no Judiciário." Valor Econômico. 26 de fevereiro de 2024. https://valor.globo.com/legislacao/noticia/2024/02/26/volume-de-processos-por-erro-medico-cresce-no-judiciario.ghtml